Artigo | Plano de Carreira: pra onde estamos indo?

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*Por Bernardo Seixas Pilotto

Criado em 2005, o Plano de Cargos e Carreira dos Técnico-Administrativos em Educação (PCCTAE) das Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) se encontra ainda em fase de implantação, pois algumas lacunas ainda existem. Para entender a importâncias do Plano e estas lacunas ainda existentes, é preciso estudar a história que trouxe este Plano à tona e também os temas conjunturais que influenciam na implementação (ou na não implementação) do PCCTAE plenamente.

Porquê Plano de Carreira?

Primeiramente, é preciso dizer que existir um plano de carreira é uma vitória dos trabalhadores, dentro da visão que o serviço público deve ser algo impessoal e perene, sem ficar sofrendo mudanças bruscas a cada mudança governamental.

Nos serviços públicos, os trabalhadores vivem uma situação diferenciada, que é o fato de estarem sujeitos a mudanças de gestão a cada 4 anos, devido aos processos eleitorais. Também estes trabalhadores votam e escolhem o seu próximo patrão, seja nas eleições para presidente, governador ou prefeito, seja nas eleições para os órgãos em que trabalham, como no caso das universidades, onde a comunidade escolhe o Reitor. Para que esta escolha seja livre, a estabilidade dos trabalhadores é fundamental.

É claro que são feitas outras pressões em cima dos trabalhadores, como a concessão de benesses, especialmente através da distribuição de cargos e funções gratificadas.

Até 1990, com a lei 8112/90 (Regime Jurídico Único), que instituiu a ideia de concurso público como método para a contratação dos trabalhadores do serviço público, esses trabalhadores eram contratados conforme indicação dos governantes, favorecendo que o serviço público fosse visto como algo de governo e não como algo permanente, como uma política de Estado.

Dentro desta concepção de que as coisas dentro do serviço público devem ser feitas de maneira objetiva, é que os trabalhadores passaram a reivindicar planos de carreira. Os planos de carreira teriam como objetivo instituir critérios objetivos para ascensão dentro dos serviços, para concessão de gratificações por titulação, entre outros pontos.

No caso do PCCTAE, avançamos em vários pontos. Há avanços na carreira para trabalhadores que façam cursos de capacitação e de qualificação. Mas ainda há elementos subjetivos, como a definição se tais cursos são de relação direta ou indireta com os cargos, que fazem com que cada IFES tenha uma interpretação diferente.

Plano de Carreira dos TAE’s

No caso dos trabalhadores das universidades, a primeira vitória foi o reconhecimento de que esta era uma categoria única. Em vários órgãos, há divisão de carreira entre as diferentes funções, como engenheiros, analistas, técnicos, etc. Se é verdade que nas universidades há uma divisão entre professores e TAE’s, é verdade também que os TAE’s estão numa mesma categoria, uma das mais diversas que se conhece, abarcando desde trabalhadores com ensino fundamental até profissionais de nível superior com doutorado.

Até que chegássemos ao PCCTAE em 2005, um longo caminho foi percorrido. Esse caminho foi duro e fruto de muita luta da categoria, que por diversas vezes teve que fazer greve para conseguir vitórias perante os governos.

Em 1985, foi instituído o Plano de Cargos e Salários das Fundações, que acabou por reconhecer nossa categoria como tal. Em 1987 surgiu o PUCRCE (Plano Único de Classificação e Retribuição de Cargos e Empregos), que durou até 2005.

O PUCRCE estabelecia três níveis de classificação dos cargos: nível de apoio, nível intermediário e nível superior. Também foi o PUCRCE que estabeleceu alguns benefícios caso os trabalhadores se qualificassem. Mas as limitações eram várias, como a ausência do direito a qualificação e capacitação.

Já no início dos anos 1990, os TAE’s passaram a debater a necessidade de um novo plano de carreira, que contemplasse algumas situações: direito a capacitação e qualificação, gratificação por titulação, progressão na carreira, reconhecimento do papel dos TAE dentro do processo educacional, racionalização dos cargos e paridade entre ativos e aposentados. Dessas reivindicações, surgiu a proposta da FASUBRA para o PCU – Plano de Cargo Único.

Em 2003, após massacrar os trabalhadores do serviço público com a Reforma da Previdência, o governo federal aceitou debater um novo plano de carreira para os TAE’s. Foi organizado um grupo de trabalho interministerial, com a participação das entidades sindicais (FASUBRA e SINASEFE) e, após a greve de 2004, finalmente o PCCTAE é instituído em janeiro de 2005.

PCCTAE: avanços e necessidades

O PCCTAE é um avanço perante os planos de carreira anteriormente colocados. Ele avança pois reconhece o técnico-administrativo em educação como parte do processo educacional e porque entende a qualificação e a capacitação como direitos. Outro ponto é que este é a única carreira de nível federal que não depende de gratificações.

Mas o Plano tem ainda algumas falhas. A que chama mais atenção é os valores dos salários. Quando aprovado, em 2005, a reivindicação da FASUBRA era que o piso salarial fosse de 3 salários mínimos e que o STEP, aquele degrau que separa um nível do outro, fosse de 5%. O governo sinalizou positivamente, mas disse que seria implementado em médio prazo. Isso garantiria um salário atrativo aos profissionais, compatível com o discurso de que “educação é prioridade” e uma elevação salarial constante, a cada 18 meses, garantindo um mínimo de reposição, visto que os trabalhadores do serviço público federal não tem a direito a data-base.

Mas a realidade está longe dessa promessa: o piso da categoria, que começou em 2005 com 1,2 salário mínimo, encontra-se em 1,6 salário mínimo; o step está em 3,6%, já estando assinada lei que faz o step chegar a 3,8% em 2015. Desde 2005, o máximo que o piso atingiu foi 1,8 salário mínimo, em 2010. Essa disparidade tende a aumentar, visto que para 2014 e 2015 estão previstos aumentos de 5% no piso, percentual que deve ser abaixo do aumento do salário mínimo. Essa defasagem no piso faz com que algumas categorias presentes no PCCTAE ganhem abaixo do piso salarial nacional, o que poderia gerar algum complemento que garantisse pelo menos o recebimento do piso; em tempos de mercado aquecido, o não-recebimento do piso traz muita fuga dos profissionais das IFES.

Um ponto que era uma necessidade até 2012 e que teve avanço após o movimento grevista daquele ano foi o Anexo IV, que legisla sobre os percentuais de qualificação. Antes da greve, apenas trabalhadores do Nível E tinha direito a percentual de qualificação por doutorado (75%), apenas trabalhadores do Nível D e do E tinham direito a percentual por mestrado (52%) e assim por diante; agora todos os trabalhadores tem direito a todos os percentuais e ainda houve aumento em alguns percentuais, sendo o de graduação o mais significativo, de 10% para 25%.

Um ponto ainda não resolvido é a racionalização, que seria um processo agrupamento de cargos com funções parecidas. É o caso dos cargos de auxiliar em enfermagem e auxiliar administrativo. Em sua imensa maioria, os trabalhadores desses cargos já tem formação suficiente para ocupar os cargos de técnico em enfermagem e assistente em administração, respectivamente. E, na prática, os cargos fazem a mesma função no cotidiano das universidades. Racionalizar seria extinguir os cargos de menor qualificação e migrar os trabalhadores para os cargos acima qualificados. No PCCS (Plano de Cargos, Carreiras e Salários) das Instituições Estaduais de Ensino Superior do Paraná, atualizado em 2012, os cargos de auxiliar de enfermagem e auxiliar administrativo já estão extintos (essa é uma racionalização parcial, visto que ainda existirão muitos auxiliares até estes se aposentarem). Racionalizar também é extinguir outros cargos que não mais existem na realidade do mundo do trabalho, como datilógrafo.

Outra necessidade é o número de níveis na tabela. Um bom plano de carreira tem uma tabela que atinge o final apenas quando o trabalhador chega ao final da sua vida funcional. Nem nos adianta um plano em que em poucos anos o trabalhador chega ao topo da tabela ou um plano em que o topo da tabela tem um salário alto, mas inatingível. Em 2005, o PCCTAE tinha uma tabela interessante: eram 16 níveis, onde era possível avançar a cada 2 anos, totalizando 32 anos para chegar ao topo da carreira. Mas após a greve de 2007 o STEP foi diminuído para 18 meses; esta medida positiva gerou novas contradições, visto que o topo da carreira é atingido em 24 anos. Junto a isso, surgiram novas regras de aposentadoria para o serviço público, que impõe idade mínima de 65 anos para homens e 60 para mulheres. Imagine um trabalhador que entrou na universidade aos 22 anos de idade: atingirá o topo da tabela aos 46 anos e só irá se aposentar aos 65 anos.

Outro ponto que o próprio avanço do PCCTAE trouxe contradições é o Anexo III, que legisla sobre os cursos de capacitação. Hoje, a maior parte dos trabalhadores já está no último nível (IV), sendo necessário a criação de mais níveis. Antes das mudanças do PCCTAE em 2012, para mudar de nível III para o IV, para o trabalhadores do nível D, era preciso um curso de 150h. Agora, é permitido a somatória de cursos a partir de 20h, sendo possível a criação de novos níveis sem que seja preciso cursos muito longos que seriam muito difíceis de encontrar.

Além desses pontos, há interpretações distintas sobre alguns cargos e os incentivos a qualificação. Para o cargo Engenheiro de Segurança do Trabalho, é exigido graduação em qualquer área da Engenharia e curso de pós-graduação em segurança do trabalho. Mas o TAE não recebe, em várias universidades, o incentivo a qualificação de 30% por conta da especialização lato sensu. A lei é dúbia e cada universidade interpreta do seu jeito. Em outros cargos, de nível médio, isso também acontece, como aqueles que pedem curso técnico além do nível médio.

Terceirização nas IFES e a conjuntura econômica

Neste processo todo o trabalho dentro das IFES sofreu modificações. Atualmente, com a crescente terceirização e precarização do trabalho, muitos TAE’s são responsáveis pela fiscalização e organização das empresas terceirizadas. É o que acontece com profissionais da nutrição e da engenharia. Esse é um ponto de luta importante para os próximos anos: garantir a volta de concursos para os níveis A, B e C dentro das instituições, evitando que nossa função dentro delas seja a de um “fiscal de terceirizados”.

Portanto, nosso debate de plano de carreira deve também compreender as dimensões conjunturais econômicas e políticas, que influenciam diretamente no nosso dia-a-dia, assim como já apontamos na questão das aposentadorias. Isso é importante para termos a dimensão que a conquista destes pontos colocados acima, que parecem de bom senso, só serão aprovados com muita luta de nossa categoria.

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